Os vidros estão embaciados e eu permaneço envolto numa neblina que me aconchega; a chuva cai lentamente e a minha respiração ofegante não se sustém um segundo. Começo calmamente a desenhar umas letras naquele vidro que em nada é transparente:
"Desde há muito, talvez não seja assim tanto, que observo através de ti almas imunes às tuas impurezas. Chego perto de ti e em tudo me revejo: o gesto, o toque, a harmonia persistente e, acima de tudo, a serenidade aparente com que te deslocas, ficando sempre no mesmo sítio. Hoje, volto aqui e em nada me reencontro: não consigo ver o vento, não consigo sentir o teu canto profundo nem reconhecer as filosofias com que me embalavas. Partiste para perto, espero. Foi um bocado rude a maneira como me deixaste: sem uma carta de despedida, sem flores com um postal perfumado, sem aviso prévio; que falta de sensibilidade (aquela com que me habituaste e da qual hoje já não me sei desprender).
Seja como for, aguardo relutante a tua chegada, espero que venhas como foste: cruel, frio e transparente. Não te atrases, a rua está brilhante e ansiosa pelo teu regresso. Não tragas lembranças! Já está tudo tão cheio de recordações que mais umas a encher os espaços vazios pelo tempo não fariam qualquer sentido...(quero eu acreditar)."
Olho agora para o início da janela e as primeiras palavras já desapareceram enquanto que as outras se desvanecem, talvez a sua transparência esteja de volta.
Fica meu amor selvagem.
sábado, 27 de dezembro de 2008
domingo, 21 de dezembro de 2008
Carta ao Pai Natal
Querido Pai Natal,
este ano decidi ser diferente: não vou ser hipócrita nem pedir paz e saúde para todos; não vou dizer que me portei bem e que ajudei lá em casa. Este ano vamos ser realistas: não fiz sempre os trabalhos de casa, menti ao meus amigos e alegria no mundo todo é uma utopia.
Desde que me lembro de escrever que te peço comida para os meninos pobres, mantinhas para os sem abrigo, pão e água suficiente para todos, mas tu e as tuas renas nunca chegam a esses locais. Depois lembro-me de olhar para o lado e ver um amigo meu com o último videojogo, e ele também não se portou bem, que eu sei, e nem pediu coisas boas pro mundo (que egoísta).
E agora podes nem querer ler esta carta até ao fim, mas vamos ser um pouco mais verdadeiros: quantas cartas lês com amor? Aposto que os teus duendes assinalam os presentes pedidos e tu limitas-te a fazer de motorista de serviço. Provavelmente estas palavras nem te tocarão e estes sentimentos jamais te serão transmitidos, mas vale sempre a pena tentar (tenho de ocupar o tempo).
Depois de tanto paleio queria só te dizer para não te atrasares na entrega das prendas, o menino rico não gosta de esperar e a sua mãmã já reservou a playstation há muito.
Entretanto (só se tiveres tempo!), podes me trazer um fato de Pai Natal, para o ano faço eu as entregas.
Com muita sinceridade (só por isto já devia receber a prenda), Maria João.
este ano decidi ser diferente: não vou ser hipócrita nem pedir paz e saúde para todos; não vou dizer que me portei bem e que ajudei lá em casa. Este ano vamos ser realistas: não fiz sempre os trabalhos de casa, menti ao meus amigos e alegria no mundo todo é uma utopia.
Desde que me lembro de escrever que te peço comida para os meninos pobres, mantinhas para os sem abrigo, pão e água suficiente para todos, mas tu e as tuas renas nunca chegam a esses locais. Depois lembro-me de olhar para o lado e ver um amigo meu com o último videojogo, e ele também não se portou bem, que eu sei, e nem pediu coisas boas pro mundo (que egoísta).
E agora podes nem querer ler esta carta até ao fim, mas vamos ser um pouco mais verdadeiros: quantas cartas lês com amor? Aposto que os teus duendes assinalam os presentes pedidos e tu limitas-te a fazer de motorista de serviço. Provavelmente estas palavras nem te tocarão e estes sentimentos jamais te serão transmitidos, mas vale sempre a pena tentar (tenho de ocupar o tempo).
Depois de tanto paleio queria só te dizer para não te atrasares na entrega das prendas, o menino rico não gosta de esperar e a sua mãmã já reservou a playstation há muito.
Entretanto (só se tiveres tempo!), podes me trazer um fato de Pai Natal, para o ano faço eu as entregas.
Com muita sinceridade (só por isto já devia receber a prenda), Maria João.
quarta-feira, 17 de dezembro de 2008
sexta-feira, 12 de dezembro de 2008
Lisbon
Chegou lentamente com uma brisa matutina e um timbre arrepiante. As cores, essas são agora frias e suaves o suficiente para não amedrontar. Posso encontrar junto a ele um aconchego inútil do qual já me apoderei; um olhar terno e uns braços suficientemente longos para abarcar tudo o que é finito.
Mantém lentamente uma chama crescente que nos prende a algo todos os dias, arrasto-me com infinitas memórias no verso. A coroa da moeda é modesta, moderada, manipuladora. Beleza assim não pode ser imaginária, ou será que a realidade não me chega? Ele não pára.
Foi o amanhecer. Bom dia Lisboa.
Mantém lentamente uma chama crescente que nos prende a algo todos os dias, arrasto-me com infinitas memórias no verso. A coroa da moeda é modesta, moderada, manipuladora. Beleza assim não pode ser imaginária, ou será que a realidade não me chega? Ele não pára.
Foi o amanhecer. Bom dia Lisboa.
sexta-feira, 5 de dezembro de 2008
Reflexo
"Não se obliteram facilmente em mim impressões que me entalhem, por mais de leve que seja, nas fibras do coração." (Almeida Garrett)
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